segunda-feira, 18 de janeiro de 2010

Artigo: Pobre pesca da lagosta

Encontramos no site do Instituto Terramar, um artigo escrito por osé Augusto N. Aragão - Analista Ambiental do Ibama, sobre a pesca da lagosta.

Pobre pesca da lagosta

Em artigo, publicado no jornal O Povo, José Augusto N. Aragão - Analista Ambiental do Ibama - contesta a falta de ordenamento pesqueiro e o eminete colapso da pesca da lagosta e reflete "é como se continuássemos com o pensamento estacionado no século XIX, quando se acreditava que os recursos pesqueiros marinhos eram inesgotáveis".
O estranho título deste artigo evidencia, propositalmente, a grande contradição entre o valioso recurso pesqueiro que é a lagosta e a situação de desmando e crise por que passa sua exploração. Realizadas hoje numa extensa área que vai da costa do Amapá ao Espírito Santo, as pescarias desta espécie foram, durante décadas, geradoras de uma fabulosa riqueza, especialmente para o estado do Ceará, tradicionalmente seu maior produtor e exportador e que detinha um importante parque industrial.

No entanto, o considerável aumento da intensidade de pesca, tecnicamente denominada “esforço de pesca”, nos últimos vinte anos, resultou na diminuição do tamanho dos estoques de lagosta. Trabalhos científicos indicam que o nível do esforço de pesca na atividade lagosteira é quase três vezes maior que aquele recomendado. Grosso modo seria, como se o número de barcos pescando lagosta fosse três vezes maior que o necessário para explorar de forma sustentável o recurso.

Como consequência óbvia, observa-se a contínua diminuição da produtividade e da rentabilidade das pescarias, camuflada, até certo ponto, pelo aumento da capacidade individual de pesca das embarcações, à custa da utilização de petrechos de pesca cada vez mais predatórios. Contribuem, também, para esta falsa impressão de estabilidade do setor, os subsídios oferecidos pelo governo sob diversas formas (preço do diesel, seguro defeso, etc.).

Assim, por recomendação do Comitê Científico da Lagosta o governo brasileiro, representado pela Secretaria Especial de Aquicultura e Pesca (Seap) e pelo Ministério do Meio Ambiente/Ibama, implementou em 2006/8 um amplo e transparente programa com o propósito de reduzir o esforço de pesca e controlar a pesca ilegal.

O programa consistia em regularizar todas as embarcações que estivessem de fato pescando lagosta e proibir a pesca com redes de emalhar (caçoeiras) e por mergulho com compressor. Os proprietários de barcos recebiam, também, compensação financeira pelas caçoeiras e compressores que fossem entregues à SEAP para desativação.

Esperava-se que processo de regularização das embarcações, que permitiria conhecer e controlar, pelo menos nominalmente, o esforço de pesca, contribuísse para o início do efetivo ordenamento e controle das pescarias. Mas, eis que de repente, contrariando as recomendações Comitê Científico, e a despeito do que foi acordado e implementado anteriormente, surgem propostas e pressões para convencer o Ibama a concordar com o aumento do número de licenças. Como se já não bastasse a numerosa frota que, apesar de tudo, continua a operar ilegalmente.

É como se continuássemos com o pensamento estacionado no século XIX, quando se acreditava que os recursos pesqueiros marinhos eram inesgotáveis. Já é hora se tomarmos conhecimento que o mundo inteiro, há tempos, vem adotando critérios precautórios, recomendados pela FAO, como forma de garantir a sustentabilidade dos estoques pesqueiros e a rentabilidade das pescarias. Países como Espanha, Austrália, Estados Unidos e muitos outros adotam, inclusive, programas de recompra de embarcações e petrechos de pesca para desativação.

Sabe-se que muitas ditas “lideranças da pesca” e políticos vêm pressionando para que mais licenças sejam concedidas para a pesca da lagosta. É até compreensível que, por desconhecimento ou razões pouco nobres, pessoas leigas ao tema defendam posições equivocadas, sem consciência, talvez, da real dimensão dos problemas. Mas os órgãos governamentais não podem negar que estão plenamente informados e sabem das conseqüências imediatas e futuras que suas decisões terão sobre os destinos da pesca da lagosta e dos pescadores. Não é aceitável sejam alimentadas propostas absurdas.

José Augusto N. Aragão - Analista Ambiental do Ibama. Doutorando USP em Ciências da Engenharia Ambiental
j_aragao@hotmail.com
Fonte: www.terrramar.org.br

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