sexta-feira, 18 de março de 2011

Artigo: A nova face do melhoramento genético de abacaxi na Embrapa Mandioca e Fruticultura

AUTORIA

Fernanda Vidigal Duarte Souza
Pesquisador em Biotecnologia Vegetal e Recursos Genéticos
Embrapa Mandioca e Fruticultura
E-mail: fernanda@cnpmf.embrapa.br
 
O abacaxi é uma das frutas tropicais mais apreciadas em todo mundo e conquistou o gosto de tantos povos diferentes por seu aroma e sabor inigualáveis. Seu formato ímpar lhe conferiu o título de rei dos frutos. O Brasil, como centro de origem e diversidade da espécie, tem larga tradição no seu consumo, cultivo e também na pesquisa em torno da cultura.


A Embrapa Mandioca e Fruticultura tem um sólido programa de melhoramento genético que já gerou híbridos de grande valor como o Imperial, o Vitória e o Ajubá, resultados de anos de trabalho e dedicação de seus pesquisadores e que já se encontram em fase de comercialização. Esse programa continua crescendo e desenvolvendo novos materiais.

Entretanto, nos últimos anos, uma nova vertente do melhoramento surgiu e seus primeiros resultados deverão sair ainda este ano: os abacaxis ornamentais. Detentora de um banco de germoplasma com mais de 600 acessos e uma enorme riqueza e variabilidade genética da espécie, a Embrapa Mandioca e Fruticultura identificou variedades silvestres com grande potencial ornamental e todo um trabalho de caracterização vem sendo realizado nos últimos anos. Dentre as variedades silvestres, muitas possuem frutos pequenos, hastes retorcidas e cores variadas, características muito interessantes e que podem ser melhor exploradas como ornamentais. A partir de um criterioso trabalho realizado com esta coleção, foi possível identificar materiais com potencial para usos diversos no segmento de flores, como plantas que podem ser comercializadas em vasos, como hastes florais, para paisagismo e mesmo para folhagens de corte.

A depender do uso a que se destinam, as características almejadas são diferentes. Os abacaxis a serem usados como hastes florais precisam ter hastes longas, frutos pequenos e uma relação coroa/fruto bem equilibrada. Para o mercado externo, estas hastes devem ter no mínimo 40 cm e ser retas. Já em testes realizados com consumidores e floristas brasileiros se observou que o gosto do brasileiro é diferente. Nossos floristas apreciam hastes sinuosas, que conferem mais movimentos aos arranjos florais. Para a comercialização em vaso, as plantas devem ser compactas, com folhas e hastes curtas e frutos pequenos. Já o uso no paisagismo é livre, mas algumas plantas de porte grande se prestam bem para grandes espaços. As folhas, por sua vez, são excelentes na composição de arranjos e chegam a durar mais de 30 dias em esponjas florais.

Desse programa de melhoramento já foram gerados híbridos de grande beleza, cuja gama de formas, cores e arquiteturas encanta ao primeiro olhar. O abacaxi ornamental já é comercializado na Europa há pelo menos uma década. A exoticidade da pequena fruta sustentada por uma haste permite a confecção de arranjos diferenciados e originais, atraindo consumidores ávidos por novidades.

No Brasil, entretanto seu mercado é praticamente inexistente e se conhecem apenas duas variedades, Ananas comousus var. bracteatus e var. erectifolius, este último velho conhecido dos índios que usavam este material na confecção de cordas e outros adereços. Esse abacaxi é procedente da região amazônica e seu sistema de cultivo já é bem conhecido dos produtores/exportadores, não se constituindo mais em novidade. Por isso a demanda por novos materiais, oriundos de hibridações controladas, dirigidas e com características inovadoras. Esse é o viés do programa que atualmente é desenvolvido na Embrapa Mandioca e Fruticultura, voltado para a exploração do potencial ornamental desta espécie tão brasileira.

Uma faceta importante deste programa foi a realização de parcerias sólidas e confiáveis com colaboradores que conhecem o mercado e o produto, a exemplo da ABX Tropical Flowers for Export. Essa empresa iniciou a produção de abacaxis ornamentais em 2005 em uma fazenda localizada no município de Ceará-Mirim, no Rio Grande do Norte, distante 50 km da capital, Natal. Em 2006 iniciou a exportação para a Holanda e desde então os embarques têm sido regulares, semanalmente, em média de cinco mil hastes de duas variedades de abacaxi ornamental.

A empresa conheceu o programa da Embrapa e prontamente se interessou pela validação destes materiais já sob seu sistema de produção, diferenciado do que é usado para o abacaxi comestível. A importância desta parceria não está apenas no alcance do mercado externo, mas também na experiência que a empresa tem com o cultivo do abacaxi ornamental e todo o processo de pós-colheita para exportação.

Outra parceria muito interessante foi com as empresas sócias TopPlant/BioClone, ambas com larga experiência na produção de mudas de fruteiras, incluindo abacaxi. A TopPlant foi fundada em março de 2002, especializada em produção de mudas de melão, melancia, mamão, maracujá e hortaliças em geral, utilizando técnicas de avanças de macropropagação (enxertia e microenxertia) sob condições modernas de cultivo protegido.

Já a BioClone é uma empresa incubada através do Programa de Apoio ao Desenvolvimento de Novas Empresas de Base Tecnológica e à Transferência de Tecnologia (Proeta), da Embrapa, desde 2008, e é especializada em micropropagação de abacaxizeiro, bananeira, cana-de-açúcar e flores tropicais. Ambas as empresas encontram-se no município de Icapuí (CE), região da Mata Fresca, numa localização central em relação aos polos cearense e potiguar de produção de melões, bananas e mamões.

O interesse nos abacaxis ornamentais está concentrado no mercado interno, valendo lembrar que o Ceará já é um polo florícola consolidado no Brasil. O produto de maior interesse para a empresa são os abacaxis em vaso e mudas clonadas das novas variedades.

Por outro lado, e não menos importante, realizou-se uma parceria com a Fundação José carvalho, cuja missão social é apoiar comunidades rurais por meio de uma associação de pequenos produtores. Um dos campos da fundação está na cidade de Entre Rios, no estado da Bahia, onde funciona a Escola Agrotécnica Tina Carvalho, cujo foco é a formação de crianças e adolescentes oriundas das famílias associadas. A ideia, com esta parceria, é viabilizar também um sistema de produção que possa atender ao pequeno produtor, ampliando o leque de possibilidades e alternativas para melhoria de vida destas famílias. O sistema de produção adotado pela fundação considera tratos culturais alternativos e que possam estar ao alcance destes pequenos produtores.

Dessa forma, essas parcerias buscam objetivos diferenciados – a exportação, o mercado interno e o pequeno produtor –, deixando claro o uso diversificado que pode ser conseguido com esses belos abacaxis e com parcerias acertadas.

A finalização dos produtos e os ajustes finais nos sistemas de produção estão sendo realizados em conjunto Embrapa/empresa (ou fundação), mostrando a viabilidade de se trabalhar a transferência de tecnologia de forma a atender aos anseios e às demandas do produtor.

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