domingo, 17 de outubro de 2010

Diário do Nodeste: Turismo sustentável aliado à preservação ambiental

DESENVOLVIMENTO LOCAL

Turismo sustentável aliado à preservação ambiental

Lagoa da torta, localizada no Município de Camocim. Lá, o vento não falta para os praticantes do kitesurf e a tranquilidade é outra opção
FOTOS: MELQUÍADES JÚNIOR

17/10/2010
As pequenas comunidades litorâneas tentam mostrar para os visitantes um novo modelo de turismo

Camocim. O Ceará é a "Terra do Sol", tem 573km de frente para o mar, e em mais de 100 comunidades que margeiam as praias existem várias formas de receber turistas, que alguns gostam de resumir a "visitantes". E visita tem que ser bem recebida. Os povos do mar, que antes eram figurantes nos cenários dos cartões postais, são agora os anfitriões do lugar em que vivem. Tem aumentado o número de empreendimentos turísticos organizados pelos próprios moradores, com o diferencial de oferecer trilhas ecológicas e manejo sustentável do bom divertimento. Entra em cena o turismo comunitário.


Em Camocim, na Zona Norte do Estado, tem uma comunidade que movimenta suas casas de acordo com o movimento das dunas, que não param de se mexer. Têm lagos com coqueiros e carnaubais, vento suficiente para fechar os olhos e pensar que voa, ou então praticar parapente e kitesurf. Tem um braço de mar com banho de água doce. E mais dunas. Duas vezes ao dia, Tatajuba é ilhada pelas águas da maré cheia. Tem um morro que dá uma dimensão de 360 graus da paisagem. O sol também se põe lá. Enquanto resiste à especulação imobiliária para o turismo de luxo, as famílias se reúnem na Associação Comunitária de Moradores da Tatajuba (Acomota) e organizam o roteiro turístico. O guia André Higino, de 25 anos, casado, sustenta a família mostrando a beleza de onde mora. Quando o carro quer encalhar na areia, André indica, numa estrada no início da duna, o exato ponto de travessia.

Do lado da Tatajuba tem uma lagoa azul que se forma de um braço de mar. É a Lagoa da Torta. O vento não falta para os praticantes do kitesurf. O morador Rafael de Carvalho, filho de pescador, é o professor. No ponto da lagoa que emenda com uma duna tem uma tirolesa, para alegria da meninada, inclusive da Tatajuba. Nessa comunidade, os "nativos" também recebem o mesmo atendimento que os turistas.

Já em Aquiraz, litoral leste do Estado, está situada a primeira Reserva Extrativista do Ceará (Resex). É a comunidade do Batoque, que possui unidade de conservação e se caracteriza pelo turismo agroecológico. Cerca de 320 famílias vivem à beira-mar, vivendo, principalmente, da pesca. Os moradores, hoje empreendedores do turismo, foram capacitados para atuarem no ramo, e levam os turistas a um passeio pelas lagoas, manguezais, riachos e um delicioso almoço na beira da lagoa ou da praia. Há dois meses foi inaugurada a Pousada Comunitária Marisol, com quartos tematizados simbolizando a renda, os búzios e a pesca. "É uma forma de a gente manter a terra da gente, de que as pessoas não queiram sair daqui, porque é nosso lar, não dos especuladores que querem tomar as terras só pra lucrar com a beleza da nossa casa", afirma Raimundo Tibúrcio, responsável pela pousada.

Em Aquiraz também tem outra lagoa. Não é muito azul, mas é encantada. Contam os moradores mais antigos que um índio pescador viu um peixão lindo e dourado, lançou o arpão, mas o peixe ferido fugiu. Noutro momento o índio foi abordado por uma linda mulher, que o levou para o fundo do lago. "Eu trouxe você para salvar meu pai", disse a linda princesa. Tirado o arpão, desfeita a tragédia, o pescador fez um passeio por um paraíso, cheio de plantas, animais de toda espécie. A história atravessou séculos, foi contada pelo pai e hoje pela própria Cacique Pequena, a primeira cacique mulher do Brasil, da etnia jenipapo-kanindé, em Aquiraz. "Quase toda semana recebemos turista, pesquisador, estudante, que vêm num ônibus enorme. A gente trata todos com carinho".

Entre Fortim e Beberibe existe uma comunidade que pratica a agroecologia. Os moradores do Assentamento Coqueirinho desenvolvem sistemas agroflorestais, apiário, banco de sementes. Com a mesma experiência ecossustentável atua a Prainha do Canto Verde, conhecida internacionalmente. (MJ)

MOBILIZAÇÃO
Rede articula comunidades
Rede Tucum disponibiliza site com informações turísticas

Fortaleza Para ajudar as comunidades na mobilização pelo turismo sustentável, respeitando as singularidades culturais e a identidade territorial, uma rede de solidariedade tem feito sucesso, na realização de oficinas de capacitação e definição de estratégias para o desenvolvimento das comunidades. A Rede Cearense de Turismo Comunitário (Tucum) promove os lugares mencionados nesta reportagem e vários outros dos litorais leste e oeste do Estado.

A Rede trabalha com dez comunidades costeiras, entre indígenas, pescadores e moradores de assentamentos rurais. Apoiam a ideia do Instituto Terramar e a Associação Tremembé, esta originada na Itália. "Oferecemos um turismo que é sustentável, não agride o meio ambiente nem as comunidades que moram lá. A atividade é deles, o benefício é todo deles, e é uma forma de se manterem na própria terra", defende Mônica Bonadiman, uma das articuladoras da Tucum.

Essa proposta de turismo se diferencia do turismo convencional, que dá como exemplo a Praia de Canoa Quebrada, em Aracati. "O turismo predatório acontece a cada dia em muitas comunidades. Tem empresários grandes e médios que usam metodologias muitas vezes pouco legais e se apropriam das terras da comunidades para implementar empreendimentos turísticos. Por isso existe a luta das comunidades ", pontua. (MJ)

Fonte: Caderno Regional - Diário do Nordeste

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