Ancoradouro da Barra Grande. Ilustração. Foto. Adolfo Maia |
A lagosta é um dos principais itens de exportação do Estado, porém ano a
ano a produção do crustáceo vem diminuindo. O fato preocupa
ecologistas, estudiosos e empresários do setor
A gestão da pesca da lagosta no Ceará é ineficiente?
SIM
A crise sem
precedentes, como afirmado pelo presidente do Ibama, ao apresentar o
Plano de Gestão para o Uso Sustentável de Lagostas (2008), aliada à
opinião de pesquisadores, gestores, pescadores e demais componentes da
cadeia produtiva, no Ceará e estados produtores confirmam a ineficácia
das políticas públicas de gestão desta que é, ou foi, uma das principais
atividades pesqueiras nacionais. Quer pelo volume de divisas gerado,
pelo número de pescadores, armadores e trabalhadores envolvidos ou pelo
fato de estar localizada em uma das mais pobres regiões do País.
Dentre
os motivos para o insucesso identificam-se a inexistência de pesquisas
atualizadas que forneçam o indispensável subsídio técnico à tomada de
posições; a histórica indiferença de estados e municípios que, tendo em
vista a prerrogativa constitucional que define o Governo Federal como
responsável pela matéria, nunca se envolveram na sua discussão, não
obstante serem os prejudicados quando, por exemplo, a geração de
receitas da atividade despenca de US$ 80 milhões/ano para pouco mais de
US$ 35 milhões.
A permanente vulnerabilidade dos gestores que,
sistematicamente, cedem às pressões e, sem base científica, antecipam ou
reduzem o defeso, autorizam o emprego de aparelho de pesca predatório,
admitem, por ineficácia da fiscalização, o desembarque de fêmeas ovadas
e, o que é o mais grave, encontram alternativas de regularizar barcos
que pescam sem a indispensável (sic) licença especial; a
indisponibilidade de recursos para o efetivo exercício da fiscalização.
O
questionável modelo de gestão “compartilhada”, tendo em vista que os
reais produtores – pescadores de pequena, média e grande escala – pouco
participam e, na maioria das vezes, são representados por pessoas
alheias à atividade produtiva, salvo o fato de habitarem a região
costeira, fenômeno inerente ao perfil da atividade, como afirmado, em
obras recentes, por Diegues e Dias-Neto.
Este modelo há que ser
urgentemente modificado, o colapso total da atividade concorrerá para
prejuízos sociais violentos e vidas já foram retiradas por conta desta
ineficácia.
Felizmente, há alternativas que, tempestivamente
adotadas, poderão garantir que a pesca da lagosta se desenvolva com a
necessária sustentabilidade biológica, econômica, social e ambiental.
Resta, a quem de direito, arregaçar as mangas, firmar a coluna e fazer
cumprir a decisões de uma política pública que há cerca de meio século
vem se conduzindo de forma desordenada.
Paulo Parente
Lira Cavalcante - Doutorando em Engenharia de Pesca da Universidade
Federal do Ceará (UFC) e analista ambiental do Ministério da Pesca
paulo.lira@ mpa.gov.br br
paulo.lira@ mpa.gov.br br
NÃONão
se pode afirmar que a gestão da pesca da lagosta no Ceará (que é de
responsabilidade compartilhada: governo/setor produtivo) é ineficiente.
Afinal, a produção cearense, após vir caindo desde 1994 até 2006 (de
6003 para 1907 toneladas/ano), apresenta nítida tendência de
recuperação, com exportações de 759 em 2007, 1.192 em 2008, 1.504 em
2009 e, finalmente, 1.782 toneladas de cauda de lagostas no ano de 2010.
Entretanto,
mesmo já tendo sido registrados também outros progressos (a
operacionalização do grupo estadual da lagosta, o cadastramento e o
relicenciamento da frota pelo Ministério da Pesca, a diminuição da
captura de indivíduos imaturos, a relativa intensificação do processo de
fiscalização pelo Ibama, a implantação da Secretaria Estadual da
Pesca), ainda permanecem sem solução efetiva problemas desafiadores.
Uns
mais recentes como a substancial queda do preço/kg (após 2008), e
outros crônicos: como a inconstância na disponibilidade de recursos
financeiros para combate à pesca predatória, o persistente exercício da
pesca ilegal de compressor, marambaia e caçoeira, além do conflito
registrado entre comunidades pesqueiras como é o caso de Redonda e
Barrinha, em Icapuí.
Assim, seguindo o espírito de compartilhar
as responsabilidades da gestão com o setor, o Ibama tem recomendado que
as empresas cearenses beneficiadoras de lagosta priorizem receber
lagostas vivas e oriundas da frota permissionada para captura pelo
Ministério da Pesca. Visto que isso: a) asseguraria a qualidade desejada
do produto recebido para processamento/exportação e, consequentemente, o
retorno do seu preço de primeira comercialização a um patamar mais
satisfatório para os pescadores; b) desestimularia o uso de caçoeira
(petrecho ilegal) de vez que nesta a lagosta é despescada morta (ao
contrário do ocorre com o covo – petrecho recomendado, em que ela é
capturada viva); e c) simplesmente promoveria a desejada
descapitalização dos “produtores” proprietários da frota pirata e
predatória, que opera com uso de compressor e marambaia, com o passivo
de ocasionar vários casos de pescadores aleijados ou mortos pelo
exercício inadequado da pesca subaquática.
Estamos conscientes de
que a busca de uma gestão verdadeiramente eficiente da pesca da lagosta
passa pela difícil (porém necessária) união de esforços dos órgãos
governamentais com o setor produtivo e a sociedade em geral, na luta
determinada e incessante pela sustentabilidade desse recurso natural.
Cláudio Roberto Ferreira
claudio.ferreira@ibama.gov.br
Eng. de Pesca e chefe do Núcleo de Pesca do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis no CE (Ibama-CE)
claudio.ferreira@ibama.gov.br
Eng. de Pesca e chefe do Núcleo de Pesca do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis no CE (Ibama-CE)
EM TERMOS
Responder
sim ou não à questão proposta pode implicar reducionismo que embota a
compreensão da realidade desta atividade, de grande importância para o
Ceará.
A pesca da lagosta passa por sucessivas crises que
culminaram com a redução da produção. Segundo o Laboratório de Ciências
do Mar (Labomar), a produtividade atual do crustáceo representa cerca de
10% da obtida na década de 60. Os resultados são óbvios: com menos
lagosta e preço em queda, a receita cai em todos os elos da cadeia
produtiva e a atividade torna-se menos interessante para os empresários.
A
crise da lagosta tem razões históricas e não é culpa apenas de
incidentes pontuais. Os interesses econômicos estimulam a pesca da
lagosta miúda e o uso de apetrechos de captura ilegais, afetando a
sustentabilidade do recurso. Sem contar os conflitos no mar e nas
comunidades, sintoma de uma crise que pode – e deve – ser contornada.
A
gestão da pesca da lagosta mudou drasticamente de foco a partir da
extinção, em 1989, da Superintendência do Desenvolvimento da Pesca
(Sudepe). Ligada ao Ministério da Agricultura, suas atribuições foram
transferidas para o Ibama. Antes descentralizada visando o
desenvolvimento da pesca, a gestão passou a ser centralizada e com viés
conservacionista. O Ibama relegou a pesca a um plano secundário de
atuação.
Instruções normativas mudavam a cada ano, alternando
liberação de apetrechos hoje ilegais como a caçoeira, período de defeso
ou captura de fêmeas ovadas. Decisões políticas do passado culminaram
com a extinção de diversos órgãos cuja atuação se relacionava com a
pesca e refletiram o descaso do Governo com o desenvolvimento regional e
redução das desigualdades.
Com Lula, o cenário começou a mudar.
Em 2004, o Governo Federal instituiu o Comitê de Gestão do Uso
Sustentável da Lagosta, que construiu um processo de ordenamento junto
com pescadores artesanais, empresários e poder público. Apesar de
avançadas, as normas não foram plenamente efetivadas, devido ao acúmulo
do passivo de muitos anos de abandono do setor. Há deficiência no
monitoramento, que aponta a necessidade de rediscutir o ordenamento.
A
criação do hoje Ministério da Pesca, e de secretarias estaduais para o
setor, parecem retomar o modelo de gestão descentralizado e
participativo. É imperativa a criação de um modelo com perspectiva
abrangente, definido pela Organização das Nações Unidas para Agricultura
e Alimentação (FAO) como Enfoque Ecossistêmico da Pesca (EEP). Um EEP
necessitará mudanças fundamentais nos arranjos institucionais que
governam a ordenação pesqueira. Nesse sentido, a eleição de José
Graziano para a presidente da FAO é bom sinal.
A solução dos
problemas da lagosta urge e interessa diretamente ao Ceará, maior
produtor nacional do crustáceo. Milhares de trabalhadores e famílias
aguardam, ansiosamente, por isso.
Dedé Teixeira - Deputado estadual (PT)
Fonte: Jornal o POVO. 18/08/2011
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